Vestígios

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Réplica.

Aterrissagem.

Ela precisava de um porre. Louco, ordinário, inquietante. Daqueles que a deixariam desorientada, e que o rumo fosse traficado por alguma alma cúmplice. PORRA!, ela se permitiu dizer. Que mulher, na idade em que ela estava, se deixava levar por um amor assim? Não havia teoria para explicar. Os deuses não foram suficientemente sábios para encontrar a solução, e ela tampouco estava a fim. As coisas não poderiam permanecer da forma em que estavam, massacrantes, engolindo sua razão e quase lhe decretando loucura. Era tempo demais, perdas demais. Ela estava beirando o extremo da insensatez, da perversão. Sim, porque aquilo era perverso: Ligar o som e ouvir qualquer balada romântica que a fizesse chorar; jogar-se na cama e passar horas a fio relembrando cada conversa, não deveria ser normal. Aliás, a normalidade não fazia parte da sua vida nos últimos tempos. Que posição o universo toma perante a paixão? Quais hinos os anjos entoam pra parecer tudo mais bonito e sereno, mesmo em meio a um tumulto infernal? Onde se esconde todo o vocabulário racional e suas ações inteligentes? Ela não sabia. Queria apenas sua paz de volta, cansada de tormentas. Ah, porque o amor é um tormento. É um bem-me-quer-mal-me-quer constante. Rápido, perigoso, insistente, fugaz. Não é benigno como as boas histórias te fazem acreditar. Não te faz caminhar segura, ele te faz beirar o precipício. Não te deixa escolhas, lhe põe opções. É um quebra-cabeças de infinitas peças, só rascunhos e sem arte-final. O amor tem fim? Tem um pretérito (im)perfeito? Melhor deixar as poesias de lado, as líricas, o sentimental. Sentimento praquê? Fonte constante de erros.

E ela não era doce. Ela não era sorrisos soltos, não era certa. Era errante. Não era boazinha. Ah! como era má! Queria tudo pra si, era egoísta, vivia no seu mundinho particular e tinha um fraco pelo sarcástico, pelo masoquismo, pelo intolerante. O marasmo lhe cansava, não aceitava o mais ou menos. Queria o céu do inferno, a pureza do pecado. Não era a fada, era a bruxa.

Mas ele chegou. O tal infortúnio chegou. E parece que tudo se inverteu, e como esconder isso? Como aceitar sua máscara se desfalecendo, caindo? Como mostrar para o mundo seus medos internos? Ela não podia ser amada. Como domar seus leões? O amor a deixava frágil, e ela odiava a dependência que aquilo lhe causava. Ele sangra, ele suga. Corrompe!

“Você é medrosa. Cadê a tua tão falada, proclamada e esbanjada coragem? Cadê suas múltiplas facetas? Me mostre os mil erros, que eu te dou um único acerto, vamos! Me desnude e mostre o quão errante eu sou. EU, esse tal amor que te sufoca. Sufoca, tem certeza? O que te prende é essa insegurança, esse medo tolo de perder. Preste atenção: se o amor for verdadeiro, não se perde, bêibe. Você ainda tem muito o que aprender. Quem te disse que eu, o amor, torno as coisas mais facéis? Elas se tornam apenas possíveis, talvez palpáveis. Não sou joguinho de sedução baratos, nem somente beijos roubados na noite. Acabei de chegar e você já me dispensou! Quanta ironia, pra tanta altivez! Só que eu sou teimoso, muito mais do que ti. Meu guia é estabelecer morada onde menos se espera, por isso estou aqui. Não se iluda. Não vou te deixar. Não sou novela, sou vida real. Sua vida. Posso me perder, mas sempre volto pra casa. Abra os olhos. Não vivo de unilateralidade. Estou aqui, sinta-me. O amanhã não se sabe.”

Ela despertou, aturdida. Não sabia se aquilo era uma promessa ou uma ameaça, mas um sorriso sorrateiro queria sair, contra toda a sua teimosia. Então lembrou-se de Caio¹, murmurando baixinho: Vai menina, fecha os olhos. Solta os cabelos. Joga a vida. Como quem não tem o que perder. Como quem não aposta, quem brinca somente.

Tirou as sandálias, se pôs descalça. Que não a escutassem, que não a percebessem, que não a retrucassem… Alguém tinha que ceder, e esse alguém era ela. Lhe disseram que o amor nunca cede.

Ainda bem.

Tamires Lima.


Ps¹: Caio Fernando de Abreu.

11 comentários:

Wellington disse...

Romântico e cheio de aventuras seu post! Gostei!!!

Grande abraço!

http://neowellblog.wordpress.com/

Unknown disse...

Ta realmente me surpreendi, estava esperando algo doce como você, mas esse "texto" revela um lado do amor não tão conhecido... o amor sempre comanda o jogo...

Unknown disse...

Ta realmente me surpreendi, estava esperando algo doce como você, mas esse "texto" revela um lado do amor não tão conhecido... o amor sempre comanda o jogo...

Unknown disse...

"Me mostre os mil erros, que eu te dou um único acerto, vamos!" Muito bom seu novo texto, como sempre vale a pena esperar um pouquinho mais... a cada parágrafo parecia que o ar ia diminuindo e eu mais envolvido no enredo. PARABÉNS, meu anjo.

Junkie Careta disse...

De autor para autor:

Baby,
Eu sempre espero muita doçura em seus textos, e, sempre , muita melancolia. Vc sempre faz essa combinação muito bem sem ser piegas. Mas, nesse texto, vejo mais componentes serem acrescentados; um certo erotismo mais despudorado(que eu já tinha apontado em outro texto) e uma certa "sujeira". Devo dizer que o seu texto ganhou muito em verdade, em realidade e por conseguinte em qualidade literária. É o seu melhor texto que já li. Eu sei que já disse isso antes e, espero dizer a cada nova publicação.

Vejo uma notória evolução, especialmente conseguida pela sua permissão pessoal em se transgredir ao escrever e se permitir ampliar os horizontes.

Parabéns.

Bjo

meus instantes e momentos disse...

o tempo passa...

Junkie Careta disse...

Oi baby,

Seu amigo poet-to-be, voltou e está convidando os amigos para compartilhar o que talvez seja a última página do spleen-rosa-chumbo,dessa vez com muito pouco rosa e muitissimo chumbo.

Traga uns lenços, uma pipoca, uma vitamina k(para cicatrizar),um estojo de primeiros socorros,um estõmago forte e um coração à prova de bala.

Grande abraço

Fernanda Tavares disse...

Caramba... acho que nunca vi um texto que relata com tanta convicção esse sentimento tão ambíguo que é o amor. É o que realmente acho disso td.

Adriano disse...

ae teu blog ta show,se quizer dar uns Risadas dar uma olhada no meu blog= funny-br.blogspot.com =D

Unknown disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Thelma disse...

Gata! Arrasou nesse texto! Amor com Paixão! Perfect!! Bjo